UMA REFLEXÃO REALISTA SOBRE A MIGRAÇÃO DO PLANO FAF PARA O PLANO III
O objetivo das considerações que se seguem é o de levantar questões que parecem não estar sendo consideradas de forma apropriada ou que se encontram dispersas. Não se pretende esgotar o assunto, até mesmo porque se trata de questão complexa, envolvendo atores e interesses diversos e com algum antagonismo.
CONCEITO DE MUTUALISMO
Presente mesmo na natureza, quando duas espécies diferentes interagem harmonicamente para benefício de ambas. Exemplos há em profusão: abelhas com as flores, aves que catam parasitas em herbívoros, micro-organismos que vivem no interior de órgãos humanos, entre outros.
No caso em questão, o mutualismo ocorre no sentido de uma comunidade associar-se, contribuindo para benefício geral. O mesmo instituto permite a existência dos planos de saúde, ou de seguros em grupo, por exemplo.
Para planos de previdência, o instituto do mutualismo representa a coluna vertebral do sistema.
Os grupos vão se ajudando mutuamente ao longo do tempo e todos se beneficiam. Os trabalhadores constituem seu fundo na juventude a ser usufruído no futuro, através da aplicação de recursos, valendo-se da força dos juros compostos no longo prazo.
A migração proposta quebra essa harmonia, ao permitir a retirada do plano de parcela considerável de recursos, o que provocará desequilíbrio na capacidade do plano em honrar os compromissos já contratados, forçando-o a se valer de contribuições extras para tentar voltar à situação anterior.
Existe um outro ponto igualmente importante que resultará da migração: aos que aderirem ao movimento, o fundo terá que disponibilizar suas reservas, sendo, pois, obrigado a se desfazer de posições de investimento adotadas em função de suas obrigações atuariais em sua situação ante.
Há dois problemas aí: o desbalanceamento geral entre Ativo e Passivo do plano e a possível perda de rentabilidade ao ter que se desfazer de ativos fora de sua época de resgate contratada. O custo disso certamente recairá sobre os que ficarem.
Não ajuda muito alegar que a migração é opcional. Há boas e reais razões para crer que a situação dos que permanecerem no plano será afetada gravemente.
Mesmo a retirada para os ativos representa vantagem ilusória.
Deixariam de contar com um plano com reais vantagens em todos os estágios de participação, em troca de uma possibilidade de ganho pessoal imediato ou de médio prazo.
Nem cabe aqui tecer considerações sobre o que fará cada migrante com seus recursos, em função de sua capacidade de gerir esses recursos. Os exemplos mostram um quadro preocupante.
Se, como se alega, os recursos continuarão a ser administrados pela mesma entidade BRF Previdência, então qual o motivo de renunciar a um plano BD para outro de menor cobertura?
RISCOS DO PLANO FAF?
Esse é um ponto que tem sido levantado ao longo do tempo, como sendo algo que pode afetar a saúde financeira da patrocinadora por conta da potencial necessidade de aportar recursos em caso de perda de rentabilidade do plano.
Ao longo de 45 anos o plano vem se mantendo saudável, rentável, muito bem administrado, honrando todas as suas obrigações e até acumulando superávit. Não exige contribuições adicionais há cerca de 20 anos.
Se há riscos da conjuntura econômica atual, é de se perguntar o que impediria o plano de superá-las, como fez com sucesso em todas as vezes anteriores, nesse quase meio século de existência.
Poder-se-ia questionar se o risco estaria nas pessoas assistidas pelo plano. Será? Os aposentados atuais garantem que vão continuar morrendo do mesmo jeito que têm feito sempre. Nenhum deles tem intenção de viver até os 150 anos, por exemplo. Logo, o risco também não está aqui.
Resta então o problema da rentabilidade da patrocinadora. Como vimos, certamente isso não ocorre por culpa real dos compromissos da mesma com o plano FAF.
Olhando para os resultados que a empresa divulga, vemos que há problemas sérios de rentabilidade, impedindo a distribuição de dividendos já de há muito. Mas estão procurando o culpado no local errado. A migração proposta obviamente não irá resolver isso. Já se adotou procedimento similar em relação aos planos de saúde dos aposentados, o que, parece claro, não contribuiu para sanar seu problema de ganhos.
A empresa encontra-se em processo de take over pela segunda vez em cerca de 12 anos. Se está sujeita a novamente mudar de mãos por essa forma algo predatória, o que jamais ocorrera anteriormente, a solução é fortalecer sua posição de mercado, seus laços com colaboradores, fornecedores, clientes e mercados, robustecendo-se e deixando de ficar à mercê de tais ataques.
Alega-se mesmo que a migração ao Plano III abriria a possibilidade de executivos atuais poderem se aposentar e continuar trabalhando na empresa, reduzindo-se assim a atratividade que a concorrência exerce sobre eles.
Argumento pífio.
Isso pode perfeitamente ser feito por simples mudança de regulamento no próprio fundo FAF, o que, a propósito, poderia ser solicitado à PREVIC pela BRF Previdência. Não há, portanto, necessidade de comprometer o equilíbrio do fundo todo por conta desse aspecto particular.
Além do mais, algum executivo deixaria a empresa somente por isso? Duvidamos. As razões devem ir muito além, passando provavelmente pelas questões de se sentir bem na empresa, ver perspectivas futuras nela, sentir-se identificado com seus objetivos e com a forma como são valorizados.
O exemplo que a empresa oferece ao pretender “lançar ao mar” os colaboradores do passado que, a propósito, a levaram a seu auge e a deixaram em seu apogeu, não deverá ter bom efeito sobre o corpo dos trabalhadores atuais, fomentando ainda mais seu desejo de buscar alternativas profissionais fora dela.
Afinal, o funcionário ativo de hoje é o aposentado de amanhã. Se a empresa vem fazendo isso agora, quem garante que não fará algo pior no futuro?
Por todas essas razões, além do fato de que os membros da ASBEF sequer foram previamente consultados, entendemos que a melhor solução, pela qual devemos lutar, é no sentido de que essa proposta intempestiva de migração seja abandonada.
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